terça-feira, 28 de junho de 2011

SE soubesse o que significa "dantesco", diria ter encontrado o próprio "dante"

e num mundo de diversidade, é tudo muito diverso. e ser diverso não quer dizer nada. mesmo. talvez só tenha sido alguma coisa impressionante lá quando a palavra foi criada. e lá se vão tempos, coisas e situações. quando há uma massificação da coisa toda, a coisa toda se torna nada. e de respeito já não se sabe mais. já que respeito foi também palavra boa, naquele lá que já citei logo ali.
e com respeito se resolve tudo. e tanta coisa desnecessária tem se tornado necessária pra resolver o que uma palavra bem dita poderia sanar.
e veio dante e me colocou a mão bem no meio do meu ombro. e me perguntou com uma cara dantesca, se eu sabia o que era uma situação dantesca. e por vergonha dele, calei. e então uma loucura começou a acontecer em minha vida. uma dessas loucuras que as pessoas costumam chamar de dantescas.
era uma rua, de asfalto, nem tão novo, nem tão velho. apenas o começo da loucurada. duas vagas de estacionamento. um cara que não sabia se usava a primeira ou a segunda. coisa de sonho maluco, vulgo pesadelo. depois de dias, o cara se decide pela primeira vaga. eu me direciono para a segunda. há uma caçamba de entulhos estacionada em plena rua. a vaga, logo acima. o carro indo em direção a vaga. uma moça de bicicleta lá longe, se aproxima rápido, tão rápido quanto o pisca-pisca do carro, ligado, sinalizando a entrada, na vaga. ela joga a bicicleta contra o carro. malvado carro. agente poluidor. destruidor das coisas naturais. detentor do poder exclusivo de acabar com o mundo. eu. ela. a bicicleta. dante acrescentou neste momento uma risada. e ainda disse com um certo tom que o carro é branco e grande. depois disso ela olhou para mim dentro do carro, jogou praticamente seus olhos dentro da lata destruidora e sussurou "filha da mãe". pedalou mais umas duas vezes, perdeu uma sacola plástica. amarrou a magrela numa árvore, com corrente e cadeado.
e tinha uma velha, que ia na igreja todo os dias. tudo bem, ela até que rezava. mas o que mais gostava era de reparar nas roupas dos outros. ver quem estava gordo e quem estava magro. ver quem se separou ou quem casou. saber da vida alheia. mas rezava, viu?
e depois olhei pra trás. só pra dizer pro dante que eu era sim, "filha da mãe", filha do pai, neta da avó, neto do avô, irmã da irmã, prima dos primos, amiga dos amigos e assim por diante. mas dante não estava mais ali. só o peso da sua mão. que ainda persiste.
e fiquei mesmo sem saber, o que é uma situação dantesca...

sábado, 25 de junho de 2011

"NÃO MATARÁS"

- nÃO MATARÁS. e não farás uma porção de outras coisas. quando? como? as falcatruas da palavras escrita ou falada, já não se sabe mais. de boca em boca, de mão em mão, de papel em papel, de opinião em ilusão. de achar que só se mata na carne, com navalha, com faca, com tiro. que é só tiro que tira a vida de alguém. e que só assim se desrespeita aquilo que já não se sabe mais se foi bem assim que foi dito. bem dito ou mau dito. nem se foi... dito por alguém que não se conhece, que não se sente, que não está mais. pois quando se tira o direito de fazer o que quer, quando se tira o respeito do peito de alguém que mal se conhece, quando se tira o que quer que seja de outro alguém, se mata. então matar não é só fazer parar de bater o coração. não é só congelar o pensamento em um cérebro inutilizado. não é só dar como destino próximo aquele palmos debaixo de nós. existem palmos pra baixo que também matam. existem paralisações de órgãos vitais que também matam. existem mortes piores do que fechar os olhos e dormir um sono diferente do que se está acostumado. e então "não matarás" se escreve com letras minúsculas. entre aspas, mas com letras pequenas, tamanho da importancia que se dá. e depois de um tempo certamente irão embora também as aspas. e por fim o NÃO se retirará.
já que o motivo torpe toma conta de nossas desmotivações. e a cada dia que passa, passamos a desrespeitar as regras claras da sobrevivência. em prol de um sobrevivência que mata, que fere, que não sobrevive muito, se não aquele pouco tempo de matar e logo morrer. ainda penso que se morre quando se mata. e a cada vez que penso que se torna mais rápida a morte de quem mata. e como falar de motivo banal, quando a banalidade é vigor e moda nos dias atuais.
sem falsidade. sem muita pretensão. eu mato. tu matas. ele mata. nós matamos. se o ser "humano" é capaz de matar, eu sendo humana também sou. e não há como fugir da raça que me foi destinada. e se não matei até agora, só há dois motivos para que não tenha acontecido. primeiro porque não percebi, o que me torna uma tola matadora. o segundo é porque ainda não me foi dada a oportunidade. um planta. um peixe. um sonho. uma expectativa. uma vida. uma pessoa.
e com a reforma da lingua se dirá "não mais matarás", em letras miúdas, pra não dizer tanto, pra não impor, pra não maltratar a natureza deste ser que vos fala. e não se falará mais em crime ou castigo. já que sem culpa pressuposta não há o que castigar. e iremos aceitando os novos formatos. as auteridades na maneira de ver a vida. ainda que num "s" possamos reler au(s)teridade, mas que nada possamos fazer. a não ser deixar de ser o que sempre fomos. banalizadores banais.
já que não há mais como banalizar a vida, passamos a banalizar a morte. como se pudessemos dormir num dia e no outro acordar.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

COM amor. SEM amor.

brigaram. feio. depois de alguns dias se dando bem. brigaram forte. com toda força que o tempo nos dá. ele sabia que já não havia mais condições de continuar. ela sabia que já não havia mais condições de continuar. continuaram. brigando de tempos em tempos. brigando de cantos em cantos. brigando e rebrigando. revirando os estômagos depois de cada refeição. sobremesando uma discussão depois da outra. remediavam. mas o remédio sempre lhes parecia amargo. dia tal ela acordou do lado avesso. colocou todas as roupas dele na mala que era dela. sabia abrir mão. colocou tudo na sala. onde ele dormia depois do jantar brigado. quando acordou as coisas estavam ao lado. olhando para ele como se pudessem dizer o que havia ali. olhando como se precisassem dizer alguma coisa além. olhou. compreendeu. compreendeu o apreendido. trocou de roupa. lavou o rosto. escovou os cabelos. pegou as malas que as duas mãos davam conta. saiu porta afora. simplesmente saiu.
ficou no canto da sala a maleta. ela não sabia pra onde ele tinha ido. passou a mão no telefone. não queria ficar com as coisas dos outros. agora ele era outro. não passava dum outro. não mais o mesmo de outrora.
- alô?
- Oi amor...
- Oi.
- Amor, você esqueceu uma mala aqui em casa. Tem umas coisas que eu acho que você vai precisar. Tem documentos, coisas pessoais...
- Ahãn.
- Se você quiser eu posso levar onde você tá.
- Não precisa. Eu passo buscar.
- Amor...
- Oi?
- Tudo bem com você?
- É...
- Então tá amor, quando você quiser me ligar pra avisar que vai passar pra pegar a maleta, me avisa tá?
- Tá...
Desligou. a mala tinha um costume muito feio de ficar no canto gritando. e como gritava alto e estridente. ela não estava acostumada.
e os dias se passam. passando com toda certeza, tal qual os intervalos comerciais. ele veio buscar a mala. ele levou a mala. a sala ficou muda. calada. sem brigas. sem jantares e sobremesas. sem.
e a cada passada, a cada rodadinha que o mundo dava, ela tinha um assunto. uma coisinha pra falar. outra pra dizer. mais uma pra dividir. foram anos. e depois de anos, sempre sobra alguma coisinha. ligava por amor.
- Amor...
- Amor, você sabe onde...
- Amor, a nossa menina...
- Amor, onde fica aquele escritório...
- Amor, você precisa passar aqui pra pegar...
- Amor.
e não tinha um dia que não ligasse. não tinha uma coisa na vida que fizessem sem depois.
- Amor?
Um dia o telefone tocou. ela atendeu e já soltou um amor. não era ele. era o advogado do pai. tinha terminado de fazer todos os papéis. tinha finalizado o processo de separação. tinham que ir na frente do juiz. dizer na frente dele que não queriam mais. que não queria ele. que não queria ela. que não queriam os dois. que o ponto final havia sido gravado bem no meio da relação. que não precisavam ou nem podiam mais.
- Amor?
- Oi?
-O advogado ligou...
- Sei.
- Amanhã às 15...
- Mesmo endereço?
- É...
- Tudo bem...
quinze horas. quinze é sempre de tarde. sempre tarde. estavam na mesma sala de espera. não esperavam por aquela espera. o advogado chamou. tinham que assinar e partir. partir ao meio. entraram. sentaram. olharam. ela não assinou. não se sabe se por falta de coragem. por falta de sorte ou prática. não se sabe. criou caso de um caso que já estava findo. disse que não queria. disse-que-me-disse. ele saiu puto. fez a mesa  e serviu. amargura. fria. cortada em fatia bem finas. tinha se acostumado. a duras penas. pena de si mesmo. tinha refeito os costumes. tinha se refeito. puto. deu uns pulos bem pequenos. quase inotáveis. quase engolíveis. estourou umas raivas por dentro. estourou uns ódios bem ínfimos. duas ou três veias do peito. estouros de desentendimentos. saiu de lá com a couraça jogada por cima do ombro.
entrou na primeira porta com placa de advogado que viu. contou tudo e mais um pouco. das ligações. da perturbação. da vida refeita. queria o litígio. queria entrar com a ação que desse saída pra vida que tinha agora. queria pra ontem. queria pagar pela borracha que pudesse apagar certas situações.
dias depois ela recebeu a intimação. dia e hora certa para o fim adiado. um ponto final forçado. contratado. pago. ela chegou com cara de sempre. com a mesma das mesmas. trouxe a menina debaixo do braço. tinha suas cartas de comoção. maquiagem debaixo do olho com alguns milímetros de borrão. roupa amarrotada.
- Quero ficar com ele de novo.
- Não quero mais.
- Mais Amor...
- Seu Doutor, não tem mais nem menos. Agora eu quero o divórcio.
- Mas eu não sabia. Amor eu juro que não sabia...
e foi longe essa discussão. desconfia-se que depois de alguma tempo, o próprio juiz da questão saiu dali com seus pensamentos. foi e voltou várias vezes. e numa dessas voltas, falou com a voz até bem mais alta do que poderia ter usado.
- Dona Abigail, a senhora não quer aceitar um acordo? Vamos por fim a este conflito.
- Não quero.
- Após aferir do fatos, designo que Senhor Amor de Almeida, não é mais considerado esposo de Abigail de Almeida, que passa a se chamar Abigail Souza, seu nome de solteira.
e ela, com os olhinhos rasos d'água. De acordo, Senhor Amor?
- Amor...
estava feito. estava divorciada. o amor não fazia mais parte de sua vida.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

DIA. APÓS. NOITE.

EU ACORDO. estou de acordo em acordar. na boca. um gosto. conhecido. nem por isso querido. quisto. o frio entra por frestas inexistentes. nem por isso menos gélido. o movimento involuntário pede para acontecer. complexidade. manhã. o dia segue. seguinte. mandíbula cortante. travada. trava social. focinheira humana. as pernas se deslocam cama afora. não. não é como se flutuassem. tem o peso real. na realidade um pouco maior do que a realidade exige. mas não há como mensurar. nem peso. nem realidade. consulta marcada. não mais o mesmo doutor de sempre. dentes. consulta marcada. programada dias atrás. eletiva. eleita numa manhã pra outra manhã. programação. ainda existem situações programadas. e essas mesmas, muitas vezes nos fogem. sempre. dia. após. noite. nos fogem. escova. pasta. água. dentes. saliva. o mesmo de sempre. por favor. o mesmo de sempre. não como sempre. já que o gosto conhecido se faz presente. desagradávelmente presente. desagradável. presente. você quer ganhar um presente? desagradável presente dado por outras mãos dentro da boca alheia a minha vontade de querer o gosto. gosto. escovo. dentrífico serve somente para os dentes. não tente. não tente isso. em casa. gosto. artificial de tutti-frutti. como se fosse possível colocar num pequeno tubo todas as frutas do mundo. você conhece todas as frutas do mundo? como cabem em meu pequeno tubo vermelho todos os sentimentos do mundo. mesmo que eu não conheça todos os sentimentos do mundo. mesmo assim eles habitam aqui dentro. que também é fora. que também é tudo e nada ao mesmo tempo. que no fim do dia é o que sou. nem dia. nem noite. e depois pensar e dirigir não são compatíveis. como um coração de alguém que nunca amou num peito de quem sempre ama. e dirigir um carro seria num momento qualquer como dirigir a vida de alguém. e quando se bate contra um poste se descobre que este alguém pode e vai já é você. e seus dentes de repente se quebram nessa quebra. e você sente o gosto que eles soltam quando partem. seus dentes. e o volante em suas mãos já não faz mais sentido. não tanto quanto as piores músicas tocadas nas piores rádios. que neste momento são só o que você deseja ouvir. 

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Doutor?

Doutor?

Eu tenho sonhado com você, Doutor. tenho sonhado com certa frequência. para não dizer todos os dias, uso "certa frequência". mas a verdade é que em meus sonhos Doutor, as coisas são bem diferentes. neles você faz coisas que eu desejo que fizesse na realidade. mas na realidade as coisas não são como eu acho que deveriam ser. nos sonhos você é gentil, amável, seguro, tem certas atitudes Doutor. me entende, Doutor? Não. não é?
eu sei que sonhos são apenas projeções, Doutor. sei que neles você não é você e sim eu, um eu que se transforma em você, como uma projeção do que eu gostaria que você fosse, fizesse. mas realidade é outra coisa, não é Doutor? na realidade as coisas acontecem como tem que acontecer, e não como gostaríamos que acontecessem. e o que eu faço com a sensação com a qual eu acordo, depois destes sonhos? o que eu faço quando te olho, Doutor, e vejo o que não gostaria de ver. quando percebo que foi apenas um sonho e que na realidade, a realidade é o que se apresenta e não o que se sonha? o eu faço quando te ligo Doutor, e você não atende. e quando atende me diz com a mesma voz dos sonhos que na realidade, não pode me atender, que não sabe do que eu estou falando, que não pode agora.
o que eu faço com todas aquelas coisas que estão aqui Doutor?
o que faço com as sensações, com os cheiros e gostos Doutor?
o que eu faço com a minha realidade, que não corresponde com a sua realidade e que no fim das contas, que são bastante altas, não fazem parte da realidade real?
Doutor, eu tenho sonhado muito com você.
Doutor, eu sei que isso quer dizer alguma coisa, talvez você queira me dizer alguma coisa.
mas eu não sei o que isso quer dizer.
Eu sei que sonhos não fazem parte da realidade. mas a minha realidade é que eu tenho sonhado muito com você. e que os sonhos são bons e me fazem muito bem. e que é neles que eu me pauto. e que esse você que não é o você dos sonhos, não faz sentido pra mim.

Doutor, que horas são?

Doutor, eu liguei para lhe fazer duas perguntas.

Doutor, eu posso fazer?

Doutor?

Você também tem sonhos?

Doutor, Eu também estou neles?

Doutor, talvez sejam mais do que duas.

Doutor, nos seus sonhos eu sou muito diferente?

Doutor, eu estou acordada ou sonhando?

Boa noite, Doutor!

leve 1. pague 2.

aos poucos.
vamos perdendo.
a capacidade de.
amar.


já que o que se vende nas prateleiras dos supermercados, esse combo formatado e auto-explicativo, não é amor. mas perdemos a noção do outro. perdemos a noção da existência do outro. ali, ao lado. e amamos a nós mesmos e o respingo disso, que suja a "roupa" do outro chamamos de amor. já que na minha opinião, está longe de se chamar de "amor" uma atitude egocêntrica de adoração ao máximo (mínimo) que somos e que não tem nada haver com as outras pessoas. estejam elas ao nosso lado ou não. vamos perdendo a capacidade de amar, por julgar que qualquer coisa, sem pensar, sem refletir, sem nada, é amor.
por banalizar. por deixar raso. por ser presunçoso. por ser pretencioso. justamente por isso compramos as mensagens toscas que nos vendem como se isso fosse amor. como se só de pegar na mão, já amor. como se só de olhar no olho, já amor. como se só de passar um tempo junto, já amor. como se só, já amor. e então tudo (e nada) já é amor. amamos mais do que poderíamos suportar, mas suportamos. já que isso que dizemos o tempo todo ser amor, não passa de uma outra coisa, uma gama de sentimentos incompletos, que falsamente denominamos amor. e não que eu saiba, e não que eu ame, e não que eu fora disso tudo. não! no meio da massa mole de pessoas que "amam", também estou.
e mais um dia, e mais uma hora, e mais uma vida e mais um amor. e passamos o tempo todo nos convencendo. nos enganando. amando!
e daqui a pouco não saberemos mais amar. já que não sabemos o que é amor. e como é que se faz um bolo, sem receita, sem saber a receita de cor. se faz um bolo que é pizza, e se chama de bolo, e se diz pra todo mundo que daqui por diante, bolo é assim. pizza. e depois cada um passa adiante. passa a " receita" do novo modelo moderno de bolo. e o que era bolo nunca mais se soube...
e respostas eu não tenho, já quem nem as perguntas sei mais fazer. e teremos que aceitar o que houve com nosso amor. ou procurar se ainda existe alguma ponta que possa ser puxada. pra recuperar o que era e já nem sei se foi o TAL DO AMOR.

"e nesse dias tão estranhos.
fica poeira se escondendo pelos cantos.
esse é o nosso mundo.
o que é demias nunca é o bastante."