ANDAVA sozinha pelo parque. ofegante, encalorada. bolsinha bem pequena, à tira-colo, dentro batom vermelhinho brilhoso, moedas de baixo valor, telefones anotados em papéizinhos. pra lá e pra cá, como peixe na corrente. gostava mesmo de ficar perto da cachoeira artificial, não se importava com esse tipo de artificialidade. aquele barulho ensurdecedor a levava para um outro lugar, um lugar chamado pelúcia, onde tudo era quente e macio. gostava do quente e macio, se sentia bem neste lugar, se levava para lá constantemente. sentiu a presença do outro, sentiu-se tentada a olhar e olhou. a única coisa que viu foram suas mãos, próximas do meio, segurando o tal de leve. aguou-lhe a boca. desejou. estava acostumada, mas desejou. sorriu desajeitada. mostrou os dentes pouco limpos, não alinhados, normais. procurou rapidamente um canto mais deslocado. insinuou a intenção e partiu. ainda lhe restava resquício de vergonha. chegou depressa, abaixou-se escondidinha, querendo diminuir a volúpia. tomou-o das mãos do outro num movimento de ampla destreza. abriu a boca, dando jeito de recolher os dentes, desnecessários. chupou com toda saliva inclusa, chupou em ó, em ú, quis fazê-lo em todas as vogais. tinha pressa, lembrou-se. viu o tempo escorrer por entre os matos secos e empoeirados. e ele ali, sem entender muito, mas olhando. chupou e mordeu ao mesmo tempo, tinha pressa. a boca se encheu daquele gosto vermelhinho que ela sabia decor. escorreu o liquido pelos cantos, ela aparou com os dedos. viu o fim próximo. levantou com a "dificuldade" do desequilíbrio imposto pelo sedentarismo diário. estralaram ao mesmo tempo coluna e joelhos. olhou furtiva para os lados. arrumo-se toda. restava-lhe algum pudor e pouca quase nenhuma vergonha. não costumava fazê-lo em público, mas sabia que não suportaria a vontade, mais tarde não se perdoaria se não tivesse feito. caminhou olhando para os lados. ajeitou-se mais um pouco, ficou com a impressão de um batom não proposital. passou a mão copiosamente pela boca, até deixa-la verdadeiramente vermelha. olhou para os lados uma dúzia de vezes e largou na lixeira, como quem não quer nada, o palitinho de sorvete, lambuzado, o detrito de seu pecado. caminhou sem medo. sem provas, sem culpa.
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