terça-feira, 27 de janeiro de 2009

foi assim...


que não era mais meu, eu já não estava no mesmo lugar, já não o reconhecia nem sequer em pensamento, simplesmente foi se apagando da minha mente, foi ficando para trás e eu cada vez mais desesperada, me apegando a cada coisinha que parecia ser familiar...eu cada vez mais apegada aquele tempo que já passou e que eu não queria deixar fluir...era o que de melhor havia em mim, como poderia deixar o que de melhor tenho sair de mim...a rua que outrora era de terra bem vermelha ganhou um tom cinza azulado que não me agradava, as nos chamando, e na eu fiz planos, realmente eu fiz muitos planos pra que neste ano não fosse nem assim nem assado...mas como todo plano sempre vem acompanhado de água abaixo, assim se deu...foi assim, eu pulei aquelas ondas, eu agradeci e pedir mesmo só pedi que neste que agora já é aquele eu pudesse ser menos apegada do que sempre fui...não pretendia a plenitude da abertura das mãos e do coração, acredito no tempo, sei do que ele é capaz, ao menos achava que sabia...queria poder deixar fluir, achava que é assim que tem que ser, nada de coisa alguma parada por aqui e por ali, achava que o certo era mesmo deixar estar enquanto estivesse e depois deixar partir, eu mal sabia o que era deixar partir, eu mal sabia...não imaginei que mãos assim como as minhas não se abrem com tanta facilidade como pular ondas...mas bastou meio tempo pra descobrir o que acontece comigo toda vez...sem nem ao menos querer testar conscientemente minhas promessas de ano novo voltei aquele lugar...algumas horas e paisagens e lá estava eu de volta a minha infância, aos anos de ouro, aos mais felizes de todos os tempos, eu estava lá de mala e cuia, olhando com os mesmos olhos com que aprendi a ver aquele lugar...com toda magia que me remetia aquele livro encantado de páginas sempre abertas, fui pondo os pés naquele chão e sentindo do que sou feita, de onde vim sem a preocupação do onde vou, fui rememorando todas as páginas, uma a uma, cada conto, cada histórinha que vivi em todos esses anos...mas bastou um piscar de olhos para ver que quanto mais virava as páginas seguintes menos eu as reconhecia...os lugares tinham agora as suas cores trocadas ou quando não apagadas, não se parecia mais com o lugar que eu tinha fresco em minha mente, já não mais...e a cada palavras trocada com esse ou aquele havia um dejavújaboticabeiras tinham sido podadas e não havia sequer um galho que pudesse servir para amarrar a corda do balanço, aliás, nem as jaboticabas estavam por lá...a mangueira não mostrava nem o toco da raiz, os passarinhos passavam férias em outros lugares, o sorveteiro já não mais assobiavasorveteria o de groselha não existe mais, e os que existem são químicos demais pro meu infantil paladar...quanta coisa boa se perdeu no tempo, no quarto da frente agora não há mais nada, ela não está mais lá...e ele então, quanto tempo faz que não vejo, só em sonho, foto ou memória...e nós todos, estamos todos crescidos, estamos todos em outros lugares que passam tão longe uns dos outros...o tempo voa depressa, as conversas ficam cada vez mais escassas, os assuntos mais globalizados, as pessoas já não se conhecem mais, eu mesma não me reconheço em meio a tudo isso...e quando o coração aperta eu fecho os olhos devagar, o medo de que escorram águas dali é grande, eu não poderia tocar nessa ferida sem feri-la ainda mais...recebo em minhas mãos a canastrinha e ao invés de apertá-la contra o peito como seria meu costume, somente tenho coragem de abri-la, com pouco carinho e olhos secos, programadamente secos...olho mais uma vez aquelas coisas que conheço bem e sinto meu corpo todo desmoronar, minhas peles vão se dissolvendo pouco a pouco, minhas carnes se espalham pela sala agora tão escura e silenciosa, olho mas não vejo, só olho e as palavras saem da minha boca como de um programa de computador, quem é esse meu pai?, e essa aqui?, que roupas engraçadas, olha só o que escreveram nessa, nossa que diferente, me parece...e eu de verdade perdida entre palavras desconexas e uma vontade imensa de gritar e chorar o mais alto que eu pudesse...fui sentindo minha alma toda sentida, toda esfarelada, tão amarelada e gasta como os papéis que manuseava, fui ficando daquele tamanho que só eu sei como faço depois pra voltar...fui perdendo a graça, de tão sem graça que fiquei...como é que eu não me dei conta que esses anos todos se passaram, quase trinta, como eu pude mudar tanto, como pude perder coisas tão valiosas, como pude...e quem disse que algum dia eu vou estar pronta pra perder...pra perder vocês de mim, pra me perder de mim mesma...pq ao mesmo tempo que estão todos aqui, ao mesmo tempo que sei que certas coisas passam e outras não, ao mesmo tempo me dá um vazio, quando me deparo com tudo aquilo que já não é mais e que é natural que seja assim, todas as vezes que me deparo com essa realidade que me parece tão irreal, eu fico daquele tamanho e com o coração tão apertado que parece que vai sumir...quando vejo aquelas coisinhas que ainda estão lá, quando tantos já não estão mais, quando vejo os que ainda estão tão mudados que por vezes sequer reconheço...nessas vezes que chego a não me reconhecer...me sinto tão apegada as minhas coisas, as minhas pessoas, mesmo que lute para deixar bem claro que nada e nem ninguém é meu...quando tenho que abrir minhas mãos, minha alma e meu coração e deixar fluir o que sinto é pedra, nada sai...e fico pensando nos meus votos e se algum dias vou conseguir cumpri-los, eu não sei...
quando eu pisquei os olhos e perdi o meu paraíso...quando eu percebi que nada mais estava no seu lugar, quando fiquei daquele tamainho...quando quis gritar e chorar o mais forte que pudesse e simplesmente fiquei parada, calada, ali, quando imaginei que nada daquilo fosse mais meu, e que todos tinham ido embora e eu tinha ficado só, só mais uma vez...quando tudo isso se deu, foi quando percebi que antes de eles irem embora, antes de tudo isso quem saiu de lá fui eu...não sei se posso voltar...não sei agora...o paraíso já estava perdido...

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