terça-feira, 28 de agosto de 2007

essencial essência...

é com dor e pesar que venho até aqui fazer-te queixa de mim mesma...meu nobre...meu caro...talvez não seja sequer de sua alçada ouvir tais questões, tais lamurias...porém não há mais nada que se possa fazer...não há mais a quem recorrer...sei que és ocupado...tens sempre coisas que urgem em seus afazeres...mas és o mais sábio e nobre de todos...logo venho recorrer-lhe...tamanho é meu desespero...tamanha minha gana de entender o que não se entende...sentir o que não se sente...ver o invisível...tocar o impalpável e ouvir o que é mudo...
estava vindo para este lugar...onde nos encontramos...estava a caminho...com todos meus pertences e saberes...estava mui próximo...sim...quase aqui meu garboso senhor...vi coisas com as quais jamais sonhei...escutei várias melodias...vi cores que não sabia nem ao menos que existiam...provei nectares que me deliciaram e também provei o fel que me alertou...bons e maus ventos me trouxeram...e sempre continue...sempre segui...certa noite de lua clara...que me olhava e me olhava e me olhava...cansado de tanto caminho andado...resolvi recostar-me no conforto de meu ego e dormir...era tarde...tudo tinha sido muito gracioso no dia corrido....dei-me ao luxo de ficar...meu ego estava acolhedor como nunca...quente e macio...grande e formoso como jamais vi...meus olhos foram cerrando e me deixei partir para a terra de sonhos...e não foram um nem dois sonhos nessa noite...foram os mais diversos que podem existir...eu estava em todos...como ouvinte ou espectador...sempre ali...a brisa refrescava e quando muito esfriava...e voltava a aquecer...eu ia...vinha e novamente ia...flutuava em tal mar de sonhos...e quase na despedida lunar, eis que o sonho pior que pude perceber...estava eu em meu ego...aconchegado e sorridente e uma sombra que aos poucos cobriu a lua se aproximou de mim...encobriu dos meus olhos a visão graciosa e prateada que tinha e roubou minha essência para si...e ao acordar percebi que me olhavam de uma forma diferente...alguns sentiam pena e outros curiosidade, outros tantos nem importância davam, senti que algo me incomodava, mas não pude perceber...
não havia percebido pois estava acostumada a não ver, não sentir, mas alguma coisa havia mudado depois daquele sonho, ou será que não sonhei...passei a me preocupar de maneira real com a situação e busquei entre minhas coisas o que poderia ter sumido, sem perceber que na realidade haviam roubado algo de mim...revisitei alguns sentimentos guardados por anos em fundas gavetas, lembranças foram trazidas de volta, ainda que pudessem doer, todo um ser revisitado e algo eu sabia e sentia que não estava ali...procurei e fiz até uma lista para não me perder, tal qual professora primária fui chamando um por um, estavam todos ali, mas algo não se encaixava, faltava-me algo essencial...
encontrei então com um amigo, que me perguntou coisas normais, relembramos velhos tempos e nos vieram lembranças de um passado esquecido...ainda éramos crianças, tínhamos planos para o futuro que sequer sabíamos se chegaria...o futuro estava ali em nossa frente, voltamos a recordar...veio a tona então um assunto que o fez lacrimejar e que simplesmente não me tocou...senti que era algo do passado que nos dias de hoje já não tinha justificativa...eram coisas bobas de criança e ao ver meu comentário, meu amigo chorou...me senti sem graça, tamanho homem chorando em minha frente, sorri amarelo para ele, que viu meu desconforto e em meio a um sorriso fosco me perguntou se existe me vida algo mais triste que perder sua essência...dei poucos ouvidos a situação...dei desculpa e me despedi...caminhei pelo meu caminho sem ao menos olhar para trás...pensei como é interessante ver como pelos tempos em que vivemos as pessoas se expõe...em meio a rua, depois de tanto tempo, ver antigo amigo, choramingando por perder sua essência...e que diabos é isso que se pode perder...
esqueci até que tinha sonhado...esqueci até que tinha perdido, sido roubado...segui em frente sem querer parar...atropelando o caminho, queria chegar logo, queria estar, caminhei com tanto afinco sobre esse sol de Deus quiser, que me cansei como fazia horas...arrumei meu ego novamente no solo, mais na noite em questão ele estava muito mais perto do chão...ajeitei-me como pude e não conseguia dormir, meu corpo me pedia descanso e minha mente negava tal pedido...fechei os olhos e "rezei" pra dormir, queria acabar logo aquele dia para estar amanhã lá na frente e não mais aqui...e ao pegar no sono um único sonho me apareceu, era minha vida quando criança e o tempo perfeitamente visível, passando e a cada passada que ele dava eu ia me apagando, era o tempo como borracha e eu feito de lápis e papel...a cada ano uma apagada, e mais fraco meu desenho ficava...e o tempo me dizia, - te roubaram, e o que perdeste foi o que tinhas dentro de ti -...e vinha-me então lágrimas que ainda mais borravam o apagado desenho do meu ser... acordei assustada e sofrida...procurei entre meus pertences onde minha essência estava...aos soluços percebi que havia sido roubada, perdida, já não podia precisar...levantei-me e me pus a correr em meio ao nada...era dia claro quando cheguei a esta cidade, dormi em meio a praça...acordei como mendigo...gritava em meios aos transeuntes...minha essência foi roubada de mim...
passei dias sem comer e sem dormir...procurando explicação sobre tal roubo...o que se faz com a essência dos outros, porque a levaram de mim...e depois de noite em claro...clareou-se minha mente...dormi mais uma vez e tive um único sonho, como quase sempre, eu olhava pra mim mesma...era triste de me ver de fora...em condições como as que me encontrava...e esse "eu" que me olhava ao poucos foi se sombreando e tornou-se a sombra que naquele noite roubou minha essência de mim...acordei aos gritos e soluços...vendo que não me roubaram...eu perdi...
pior ficou minha condição, ao ver que perdi algo que me fazia o que sou...perdi minha essência...pois nem mesmo sabia que estava ali...já rodei por quatro cantos...tentando reaver o que de mais precioso existia em mim...não dei valor quando tinha e sem ela não poderei viver...vim aqui meu senhor, já que se ouve por todo o mundo, o quanto sábio és e que maravilhas se ouvem de ti...salve-me deste desgosto de somente viver e não mais existir...recupera-me a essência e saio logo daqui...- sinto um tanto no que vou lhe dizer...e não quero desesperançar...a essência só se perde quando se deixa de acreditar, de buscar...se por dias andou pelo mundo, sem saber ou querer ir a algum lugar...se teu ego te acalenta e te faz dormir, tua essência se diminui, pois um faz como que o outro não possa existir...se seu ego em cima está...sua essência se encontra abaixo e assim quando a essência sobe o ego tem que baixar...essas interiores se completam, mas não podem disputar um mesmo espaço, se esquece o que te faz ser vivo, não há como não deixar a chama enfraquecer e apagar-...
sem essência já sei que não sou vivo, não quero para mim tal fim, vagar pela terra sem o direito de existir...preciso da minha essência para sobreviver... - mais para isso não melhor situação do que se reinventar, assistir todo dia sua vida e nela mesma se encontrar inspiração...há dias em que vais estar lá em baixo, e de tão baixo talvez ache que nunca mais ira se levantar, as dores serão mais fundas do que possa supor suportar, todos tem que passar por isso, pode-se e tem até o direito de choro e tristeza, se desejar que isso venha dar apoio...e noutros dias estará tão próxima do céu, se verá flutuar em nuvens de algodão, deverá desfrutar de tudo isso, sabendo que há dias que estará somente com os pés no chão, nem tão ao alto, nem abaixo de todos, no meio, e vários dias se seguirão assim, não existe no mundo quem viva sempre abaixo, como no alto também não se pode viver, é no meio do termo que se passa a maior parte do tempo e nossa essência é o que nos faz ir e vir...descer e agradecer por poder subir...terá sua essência de volta, quando estiver lá em baixo e tiver sonho de subir...quando estiver em cima e souber que vai descer...e quando estiver no meio e aceitar que está ali...segue que tua essência talvez te encontre logo ao sair daqui... - ...

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