sábado, 15 de setembro de 2007

BONECA DE PORCELANA...


olhem que lindo rosto de porcelana...e o vestidinho azul, com casaco de pluminhas também azul, então nem se fala...engomado e limpo que chega a perfumar...tem sobresaia e sapatinhos lustrosos...os cabelos enrolados na medida certa, com grampinhos que não deixam nunca que os cabelos com franja caiam no rosto, lindo rosto de boneca...batom de brilho leve, sombra quase transparente e cílios tão longos que quase te tocam de perto...é uma boneca de puro luxo...uma boneca de gerações que nunca irá para o lixo...é sempre nova...é sempre linda...com ela não se brinca...ela não sai da prateleira...é sempre tão nova e tão linda...esta sempre lá...serve para dar mostra de que se tem uma linda boneca de porcelana...

está sentada naquela prateleira de que todas as outras bonecas tem inveja...tem tudo o que as outros brinquedos não tem...já passou por gerações de meninas de uma mesma família...não chora...pois lhe faltam as lágrimas...é só uma boneca de porcelana...sua cabeça, para não ser mais pesada que o corpo é oca...por dentro nada tem...os sentimentos e sentimentalismos não lhe caem bem...é de lá que tudo olha...é da prateleira e da janela que tudo vê...não sorri e muito menos chora...já não sabe mais viver...nunca frio ou nem mesmo calor...se esqueceu como é que as coisas são...olha a caixa de brinquedos que é levada para fora...nunca estará dentro dela...não foi feita para tal fim...foi feita para ser exposta em prateleira...

olha suas mãos com as unhas pintadas...imagina tocando a areia...o vestidinho todo sujo...feliz voltando para dentro de casa...se mantém na prateleira pois sozinha dali não sai...não sente os carinhos que tem as demais bonecas...seu vestido já está amarrotado na parte de trás...está sentada por tempo demais...essa maldita prateleira que é seu mundo...para ela tanto faz...se sair dali daquele medíocre mundo ou nunca mais...tem vontade de sair gritando em dias como o que passa...se tivesse voz...se sua boca não fosse toda porcelana...

olha ao fim da luz do dia...quando volta para casa o tal cesto de brinquedos... as bonecas de pano com suas roupinhas imundas, que logo irão ficar descoloridas de tanto lavadas, dia após dia...estavam lá fora...podem até saber como sopra a brisa...olha as bonecas de plástico todas sujas e rabiscadas...com traços que nem seus são...parecem que se não fossem plástico esboçariam certos sorrisos que porcelana não consegue moldar...são plástico macio que não se quebra...servem a todo tipo de brincadeira...não servem para prateleira...



de que vale ser linda...de que vale ser bela...se a boneca se quebra fácil..é só de porcelana...

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